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7/06/2015


Botelho D'Oliveira




Walmir Botelho D'Oliveira.
Walmir Botelho.
Meu amigo Walmir.
Tomar conhecimento de seu falecimento, na noite deste sábado, aos 67 anos de idade, foi mais do que renovar a certeza de que nos abalamos com esses eventos porque nascemos para viver, e não para morrer - muito embora a morte seja a coisa mais certa nesta vida.
Foi muito mais do que isso.
A partida de Walmir é mais um evento que extirpa, do jornalismo do Pará, uma de suas mais qualificadas expressões profissionais, que se fez notória e respeitada não em decorrência de celebrizações midiáticas de hoje, mas porque cultivou a noção, básica e elementar, de que jornalistas não devem ser a notícia, mas simplesmente transmiti-la da maneiras mais fiel e objetiva possível.
Nestes tempos em que jornalistas, eles próprios, adoram celebrizar-se, alçando-se aos panteões das redes sociais com uma autoestima que faria qualquer Narciso corar de vergonha e sentir-se o mais humilde e recatado dos seres, Walmir Botelho era um peixe fora d'água.
A foto dele que você vê nesta postagem e foi divulgada pelo jornal Amazônia, registrada pelo repórter e velho amigo Raimundo Dias, o Zero, é certamente uma das pouquíssimas - senão a única - que devem estar disponíveis nos arquivos de O LIBERAL.
Walmir odiava os holofotes. Odiava expor-se. Em vez da sala das redações, preferia a cozinha, preferia trabalhar o seu ofício sob o quase anonimato, certo de que o leitor, esse sim, deve ser privilegiado e tratado como o grande e único destinatário do que nós, jornalistas, fazemos.
"A gente só dá importância ao que acontece na nossa porta", dizia-me várias vezes, Foi esse princípio que ele implementou em O LIBERAL, ao aumentar a visibilidade e conferir um melhor tratamento ao noticiário local, ou de cidades, como costumamos dizer.
Responsável por aquela que talvez tenha sido a maior reforma gráfica implementada no jornal, emprestando a O LIBERAL a cara que tem hoje, Walmir aliou sua experiência de diagramador (hoje pomposamente chamado de designer gráfico), função que primeiramente exerceu no jornalismo, à do editor que deve conferir à notícia a relevância adequada e sempre sintonizada com a linha editorial do veículo.
Com Walmir, convivi diariamente, e muito, mas muito proximamente, durante cerca de 20 anos. Jamais conversamos em outro ambiente - literalmente nenhum outro - que não a redação. Mas foi lá, nas noites e madrugadas, que travamos um relacionamento que ultrapassou o sentido profissional e firmou-se, verdadeiramente, como uma relação de amizade, confiança e lealdade.
Avesso, conforme já mencionado, a badalações, exposições e celebrizações, Walmir era, com a maioria de seus interlocutores, quase monossilábico. E quanto mais monossilábico, mais ele rabiscava a folha de papel - qualquer uma - que estivesse à sua frente, enquanto ouvia o outro falar.
Por várias vezes, eu me divertia, quando estava em sua sala, ao vê-lo falar ao telefone.
- Hum! - era apenas o que se ouvida Walmir dizer repetidamente e de forma esparsa, durante os momentos, às vezes 10, 15 minutos em que duravam as ligações.
Era uma sucessão de 400 mil hums, até que vinha o arremate:
- Tá bom. Depois a gente conversa - era a expressão usada para encerrar aquele diálogo, digamos assim, tão palpitante.
Monossilábico por natureza, Walmir era divertidíssimo, todavia, com alguns que tiveram mais o privilégio de sua consideração, entre os quais o repórter aqui se inclui.
Aprendi com ele a "ver com bons óculos", conforme me dizia sempre, situações delicadas que precisavam ser conduzidas com habilidade redobrada. "Vê lá como administras isso", era só o que me dizia, Mas a tradução dessa ordem era a seguinte: o bicho tá pegando!
Walmir tinha um humor rascante, cortante, ferino quando se referia, em nossas conversas privadas, a personalidades e personagens - sobretudo da política paraense - que se acham o suprassumo dos suprassumos.
Demos muitas e boas gargalhadas, ele relembrando causos que enfrentou, sobretudo quando trabalhou por muitos anos em Brasília, no Correio Braziliense, sua última etapa profissional antes de retornar a Belém para trabalhar inicialmente na Folha do Norte e posteriormente em O LIBERAL.
Comecei a associá-lo como se fosse o imperador do carimbó de Maracanã, sua terra natal, e passei a chamá-lo de Verequete, referência a Mestre Verequete, um dos ícones da cultura musical paraense. Em resposta, passou a chamar-me de Marabaixo, referência ao ritmo amapaense que, insistia ele, eu teria disseminado em Santarém, onde nasci.
Por mais de 15 anos nos tratamos assim. E na redação, muitos até entraram na onda:
- Mano, o Verequete está te chamando - diziam-me colegas muitas vezes.
Era ele, Walmir, quem me chamava.
- Vai lá com o Marabaixo e entrega isso pra ele - recomendava.
Pois o cara chegava até mim e me entregava.
Walmir vai fazer falta. Muita falta.
Já está fazendo.
Mas essa é uma daquelas contingências - inescapáveis e inesgotáveis - da vida.
À Nara, sua companheira, e a seus filhos Adriano, Bruno, Flávio e Fernando, um forte abraço. E a certeza de que temos de continuar.
Ou para usar a expressão do Walmir, temos que administrar isso.
Temos mesmo!
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Paulo Sérgio Porto Bemerguy
ESPAÇO ABERTO


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