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11/14/2008

Dênis Cavalcante


Bill Evans – Blue Notes

Quem não curte jazz, blues, viagens, saudades – melhor não continuar a leitura.
Vez em quando, é de bom alvitre andar sem rumo por uma cidade desconhecida. Fiz isso algumas vezes. Abade, Carangola, São Paulo, Paris, Nova Iorque... Ah! Nova Iorque!
Eram tempos de bonança. Saldo bancário no verde, os cabelos ainda fartos e castanhos, a pança enxuta, a mente clara... Se soubesse que aquela viagem seria a derradeira (sem percalços, preocupações...) teria curtido mais, bem mais.
Faz quinze, vinte anos? Não sei. Só lembro que era véspera do Natal. Fui a negócios. Assim como médicos, advogados, políticos. Meia hora de palestras, cursos, lari-lari... O resto do tempo dedicado à esbórnia. Com uma pequena diferença: viajei às minhas expensas. Após me instalar num pardieiro de uma estrela (pra que gastar uma nota preta pra dormitar seis horas?) comprei um mapa e tomei o Subway. Em primeiro lugar, tratei de achar a Macy’s, Blomindale’s (Lobrás, Americanas daqui) a fim de comprar os presentes da família. Brinquedos para os filhos, cremes e perfumes para a mulher, lembranças para os amigos. Feito isso - livrarias, museus, delicatesses, village, pub’s, Litle Italy, Chinatown, Central Park. As Torres Gêmeas ainda estavam de pé. Bin Laden era adolescente.
Viajar é bom demais! Sobretudo, quando não temos preocupações pecuniárias. Sem lenço, sem documento. Um paroara perdido em meio ao burburinho de Mannhatan.
Após comprar um 'legítimo' Rolex por dez dólares de um camelô americano, traçar um hot-dog numa esquina qualquer, engraxar o pisante com um brazuca mineiro, aquecer o esqueleto prestes a congelar num bueiro engordurado, chego enfim ao hotel. Tiro a roupa e me enfurno na banheira fumegante. Coisa boa. Descanso ¼ de hora e saio pela Big Apple. Encontro um pub esperto, me aboleto, peço uma dose de Jim Bean. Tem coisa melhor?
Na ponta do balcão, um americano bebericava seu drinque, concentrado num jogo insosso de beisebol. Fico na minha. Saboreio com vagar meu drinque, mordisco um mixer de castanhas, nozes e amendoins, olho ao redor. Bebuns, descasados, aventureiros solitários à cata de companhia, dois dedos de prosa.
Felizmente não era o meu caso. Apenas fazia hora a fim de assistir a um show de jazz imperdível no Blue Notes – Olho pro relógio - tá na hora! Pago a dolorosa e sigo célere para o Subway. Ao subir as escadas do metrô dou de cara com o Blue Notes. Que decepção. Um segurança do tope do Mike Tyson me barra na porta: os ingressos estão esgotados! Turista é tudo igual. Se naquela época já tivessem inventado o celular, se houvesse uma cabine telefônica à mão, ligaria pro Antonio Carlos Brandão, Luís Fernando Veríssimo, Augusto Teixeira, Mauro Monteiro, Alberto Pinheiro, Eduardo Melo, Cássio – assim como eu – apaixonados, fissurados por blues. Cabisbaixo, me preparo pra tirar o time.
Eis que surge um gringo. Pra resumir: ele tinha um ingresso e queria vender. Em Nova Iorque também tem cambista. Pago sem pechinchar e me misturo à multidão ensandecida. Cento e tantas pessoas acotoveladas em exíguos 60 metros quadrados. Quem esteve lá sabe que não tergiverso. Mesa, balcão, cadeira – nem pensar! Guardadas as devidas proporções, era como estar no Rock in Rio. Nelsão Forte que me desminta. E eis que chega Bill Evans e seu piano mágico. Silencio reverente, sepulcral.
Precavido, pedi com antecedência três generosas doses de Bourbon. Pirei, piramos! Lá se vão décadas. Um dia desses, revirando antigos alfarrábios, desenterrei o amarelado ingresso autografado por Bill Evans.

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